Deixamos para trás a beira baixa e rumamos para norte. Destino: Castelo Rodrigo, uma aldeia histórica da beira interior.
Tenho uma gaveta exclusivamente dedicada a escapadelas. Nela constam recortes de páginas de artigos de possíveis destinos, paraísos escondidos (fujo a sete pés de hotéis e turismo de massas. A expressão “all inclusive” causa-me urticária).
Constam também folhas soltas (arrancadas de cadernos A5 ou A4) com apontamentos manuscritos. Na hora de escolher o destino, uma vista de olhos pelos rabiscos “A ir” dita o caminho.
Destino definido, dedico-me a fazer autênticos itinerários: “o que ver, o que fazer, onde dormir e, claro, onde comer.”
Castelo Rodrigo.
Chegamos ao entardecer e esta aldeia medieval parece ainda mais encantada ao lusco-fusco.
Já anunciaremos a chegada, já se tiram as malas do carro. Por enquanto, o que é preci(o)so é desfrutar deste por-do-sol!
O nosso abrigo nos próximos dois dias é uma casa perto de uma cisterna, que lhe dá o nome.
Tudo o que procurávamos: confortável, aconchegante, tranquilo.
Tão tranquilo aliás que, após dois dedos de conversa com os locais, chegámos à conclusão que hoje, apesar de ser Sábado à noite, tudo o que poderia dar-nos alimento está fechado.
Apesar do javali do almoço, o meu relógio já avisa ruidosamente a hora de jantar.
Partimos então para Almeida. Lá jantaremos.
Tentamos a sorte na povoação da Malpartida. Umas luzes indicam um estabelecimento aberto. “O caçador”, diz o letreiro. Olhamos com ar desconfiado. À porta, sentados no alpendre, uns autóctones bebem o “café e bagaço” e fumam o seu cigarro. Lá dentro, praticamente vazio. Desconfio sempre de restaurantes vazios. Em condições normais, faria um gesto de “meia volta” ao R mas estamos no meio de nenhures e a fome aperta. E caramba, quão mau poderá ser?!
_”São dois? É só escolher! E aponta o anfitrião para a sala vazia”.
Sentamo-nos numa mesa encostada à janela. Pode ser que o movimento que lá fora (não!) se passa nos distraia da luz branca do interior e dos movimentos de uma cozinha meio-aberta.
Quem agora percebemos ser o dono, Sr Vitor de seu nome, (Sim, porque “o caçador” tem uns guardanapos timbrados com os nomes “Betty e Vitor”…) vem anunciar:
_”A nossa especialidade é o polvo à lagareiro”.
Adoro polvo à lagareiro mas sou exigente. E, por isso mesmo, não arrisco trair a memória de todos os polvos que comi até hoje ali. Um bife grelhado é sempre uma opção segura.
_ “Vamos antes para o naco de vitela…”
Minutos passados, lá vem o naco. O meu bem passado, o do R médio/mal, tal como pedido.
Dose generosa, apresentação cuidada, belíssimos acompanhamentos e uma carne muitíssimo suculenta e bem temperada.
A meio da refeição lá vem o Sr. Vítor perguntar se está tudo bem. Divide agora a atenção com outros comensais que, entretanto, dividem a sala (já não fantasma) connosco.
No final, não houve espaço para sobremesa, o que desiludiu visivelmente o Sr. Vítor: “É tudo feito pela minha mulher e não há mãos como as dela”.
Acabamos satisfeitos e, devo dizer, surpreendidos. Venha a conta.
Com ela, chega um pratinho com a especialidade que declinámos.
_ “É só para provarem!”
Derreto-mo com o gesto. Quem também derrete é aquele polvo na boca, à primeira dentada!…
Quem diria que era ali, na Malpartida, que comeria o que foi, sem sombra de dúvida, o melhor polvo que comi até hoje?!
Uns bons dedos de conversa à saída com o Sr. Vítor e com a mulher, Betty, quase invisível, fechada naquela cozinha, onde faz a magia acontecer!
Voltamos no dia seguinte, ali onde outrora receámos entrar.
_“É um polvo à lagareiro para dois!”
E hoje há espaço para a sobremesa!
Regressamos a Castelo Rodrigo. A avaliar pelos lençóis que apalpei há umas horas, arrisco dizer que será uma noite muito bem dormida… De barriga cheia!
Até amanhã (noutro post)!
Teste aos comentários ! Estou a gostar do que leio ! 😉
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