O internamento hospitalar é quase sempre um acontecimento perturbador e disruptivo.
E quando é uma criança a ter de vestir a bata do hospital?
Fui recentemente procurada pelos pais angustiados de “Alice” (chamemos-lhe assim), com 2 anos de idade, que, devido a perturbações respiratórias teve de ser internada na ala pediátrica.
Em termos teóricos e desenvolvimentistas é importante ter em conta que o desenvolvimento sociocognitivo da criança determina a forma como ela é capaz de interpretar e construir as significações sobre a doença:
- Abaixo dos 6 meses: À medida que cresce, o bebé vai mostrando a sua preferência pelo colo materno, assim como o seu desagrado quando é separado dele. A angústia perante a ausência materna, a angústia do estranho, dá-se pelo 8º mês de vida. Assim, no que à hospitalização diz respeito, esta fase apresenta menor risco, na medida em que o bebé não tem ainda suficientemente estabelecidas vinculações seletivas suscetíveis de serem ameaçadas por uma separação breve.
- Entre os 6 meses e os 4 anos de idade: é talvez aqui que a separação dos pais é mais perturbadora. Os tratamentos são percecionados como assustadores e ameaçadores da integridade física. A criança não tem ainda recursos cognitivos que lhe permitam elaborar devidamente a complexidade da experiência da hospitalização;
- Acima dos 4 anos: A criança já possui mecanismos para compreender a experiência do internamento de forma mais elaborada.
Independentemente da idade da criança, a hospitalização abrange aspetos como a convivência com a dor e o mal-estar, a submissão a restrições, a constante exploração do corpo e a realização de inúmeros procedimentos, alguns dolorosos, invasivos e geralmente desconhecidos.
Também independentemente da idade da criança, os pais têm uma importância fulcral na adesão (e sucesso!) do tratamento. Esta consciencialização crescente faz também com que a equipa hospitalar seja hoje muito recetiva e mesmo encorajadora à constante presença dos pais. Com efeito, a carta da criança hospitalizada (criada na década de 80) sublinha: “Uma criança hospitalizada tem direito a ter pais ou seus substitutos, junto dela, dia e noite, qualquer que seja a sua idade ou o seu estado”.
Na impossibilidade de estarem ambos os pais, este é, muitas vezes, um papel desempenhado pela mãe em particular.
Porém, para tanto, a mãe precisa ela própria de ser cuidada, pois, durante a hospitalização ela tem que lidar tanto com o sofrimento da criança, como com o seu próprio sofrimento.
Acredito que a mãe de Alice estava, também ela, a pedir colo…
Quando passada a tormenta e no regresso a casa, a Alice visitou o país das maravilhas quando voltou a dormir na cama dos pais…
(Ora, tempos passados, os pais de Alice voltaram a procurar-me com outro problema…)
Uma nota importante no que ao regresso a casa diz respeito: a rotina deverá manter-se! Ela própria é organizadora!